segunda-feira, 20 de setembro de 2010

A face obscura da Caveira de Cristal

Essas exóticas esculturas normalmente são atribuídas a culturas pré-colombianas meso-americanas, mas não há uma só caveira de cristal em nenhuma coleção de museu que tenha saído de uma escavação documentada, e elas têm pouca relação técnica ou estilística com qualquer representação de caveira genuinamente pré-colombiana. Essas caveiras são adoradas hoje por uma grande seita de velhos hippies e seguidores da filosofia New Age, mas qual é a verdade por trás das caveiras de cristal? De onde elas vêm e por que foram produzidas?
Os museus começaram a colecionar essas peças durante a segunda metade do século XIX, quando nenhuma escavação arqueológica de cunho científico havia sido realizada no México e o conhecimento sobre artefatos pré-colombianos reais- era escasso. Esse foi um período em que floresceu uma verdadeira indústria de falsos objetos pré-colombianos. Quando o arqueólogo W. H. Holmes, do Smithsonian, visitou a Cidade do México em 1884, encontrou “lojas de relíquias” por toda parte, repletas de cópias falsas de vasos de cerâmica, flautas e vestimentas.
As primeiras caveiras de cristal mexicanas apareceram pouco tempo antes da invasão francesa em 1863, quando o exército de Luís Napoleão ocupou o país e instalou Maximiliano da Áustria como imperador. Em geral, essas primeiras caveiras eram pequenas, mediam menos de 4 cm. O exemplar mais antigo parece ser o do Museu Britânico, de cerca de 2,5 cm de altura, adquirida provavelmente em 1856 pelo banqueiro inglês Henry Christy.
Duas outras foram exibidas em 1867 na Exposição Universal de Paris como parte da coleção daquela que provavelmente é a figura mais misteriosa na história das caveiras de cristal: Eugène Boban, um francês que serviu como arqueólogo “oficial” na corte mexicana de Maximiliano.
Em 1874, o Museu Nacional de História do México comprou uma pequena caveira de cristal do colecionador mexicano Luis Constantino por 28 pesos, e outra por 30 pesos em 1880. Em 1886, o Smithsonian adquiriu uma peça semelhante da coleção de Augustin Fischer, que havia sido secretário do imperador Maximiliano no México. A peça, no entanto, desapareceu misteriosamente da coleção do museu por volta de 1973. Quando o mineralogista William Foshag, da equipe do Smithsonian, descobriu nos anos 50 que a caveira fora esculpida com um esmeril moderno, o artefato foi exposto em uma mostra de fraudes arqueológicas.


Esses pequenos objetos representam a “primeira- geração” de caveiras de cristal. Possuem um furo vertical, de cima a baixo do crânio. Esses furos podem de fato ter origem pré-colombiana, e as caveiras seriam simples amuletos de quartzo meso-americanos, posteriormente esculpidos novamente para serem vendidos no mercado europeu.
Uma caveira de segunda geração – de tamanho natural e sem o furo vertical – apareceu pela primeira vez em 1881 em uma loja de Paris cujo dono não era outro senão Boban. Essa caveira tem quase 16 cm de altura. A descrição no catálogo que ele publicou não indicava o local onde ela teria sido achada, e a peça é listada separadamente em relação às suas demais antigüidades mexicanas.
Uma terceira geração de caveiras apareceu por volta de 1934, quando Sidney Burney, negociante de arte de Londres, comprou uma caveira de cristal de proporções quase idênticas às do exemplar que o Museu Britânico comprara da Tiffany´s. Não se sabe onde Burney adquiriu a peça, mas provavelmente trata-se de uma réplica da caveira do Museu Britânico – quase exatamente do mesmo formato, mas com os olhos e os dentes modelados de forma mais detalhada. A mandíbula é separada, o que a coloca, por si só, em uma categoria à parte. Em 1943, foi vendida pela companhia de leilões Sotheby´s em Londres para o explorador britânico Frederick Albert Mitchell-Hedges.
Apesar de quase todas as caveiras de cristal terem sido identificadas como astecas, toltecas, mistecas ou às vezes maias, elas não refletem as características artísticas ou estilísticas de nenhuma dessas culturas. As versões astecas e toltecas de cabeças da morte eram quase sempre esculpidas em basalto, apenas às vezes cobertas com estuque, e eram provavelmente todas pintadas. Esculpidas de maneira mais crua que as caveiras de cristal, elas são mais realistas, principalmente na representação dos dentes. Os mistecas às vezes fabricavam caveiras de ouro, mas essas representações são descritas mais precisamente como rostos em forma de caveira com olhos, nariz e orelhas intactos. Os maias esculpiam caveiras, mas em relevo em pedra calcária. Muitas vezes, essas caveiras, esculpidas de perfil, representam dias do calendário maia.
No final das contas, a verdade por trás das caveiras deve ter ido para a cova com Boban. Ele conseguiu confundir muita gente por muito tempo e deixou um legado intrigante, que continua a nos estarrecer um século após sua morte. Boban seguramente vendeu a museus e colecionadores particulares algumas das mais intrigantes falsificações conhecidas, e talvez muitas outras ainda estejam para ser reconhecidas. Este certamente parece ser um bom roteiro para o cinema. Como o Filme Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal.

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